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5 CADEIRAS EM JOGO: O PODER OCULTO ALÉM DAS ELEIÇÕES DE 2026

POR QUE AS PRÓXIMAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS PODEM REDESENHAR O STF MAIS DO QUE QUALQUER OUTRA NA HISTÓRIA RECENTE?

No dia 3 de outubro de 2026, milhões de brasileiros irão às urnas para escolher um presidente. Mas o que poucos sabem é que, naquele domingo, estarão decidindo além da cadeira que se sentará no Palácio do Planalto pelos próximos quatro anos. Estarão, potencialmente, definindo quase metade da composição do Supremo Tribunal Federal (STF) até 2034. Segundo dados oficiais, o próximo presidente terá a oportunidade de indicar dois ministros em seu primeiro mandato, e caso reeleito, mais três, totalizando cinco das onze cadeiras da mais alta corte do país. Uma matemática simples, mas com implicações profundas que vão muito além de um ou dois mandatos presidenciais.

O TABULEIRO POLÍTICO PARA 2026

O cenário político brasileiro em 2025 já começa a dar pistas do que podemos esperar para a próxima disputa presidencial. Após atingir o menor índice de aprovação de seus três mandatos – apenas 24% segundo pesquisa Datafolha de fevereiro de 2025 – o presidente Lula enfrenta uma rejeição recorde de 41%, superior até mesmo àquela registrada durante o auge do escândalo do Mensalão em 2005. Não por acaso, o campo da direita já movimenta suas peças.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, aparece como um dos nomes mais robustos para liderar a direita em 2026. Ex-ministro da Infraestrutura de Bolsonaro, Tarcísio representa uma direita que busca se apresentar como mais moderada e técnica, sem abrir mão de bandeiras conservadoras.

Mas Tarcísio não está sozinho. A análise da CNN Brasil publicada em fevereiro deste ano menciona sete potenciais candidatos da direita, incluindo os governadores Ronaldo Caiado (União Brasil), Romeu Zema (Novo) e Ratinho Junior (PSD), que têm trabalhado para construir projeção nacional. O próprio ex-presidente Bolsonaro, mesmo que não possa ser candidato, mantém forte influência sobre uma parcela significativa do eleitorado.

A realidade é que 2026 não será apenas mais uma eleição. Será o momento em que o Brasil decidirá não apenas seu próximo presidente, mas potencialmente a orientação jurídica e constitucional do país pelos próximos 20 anos.

A BALANÇA INVISÍVEL DO PODER

Para entender a verdadeira dimensão do que está em jogo, é preciso compreender o que representa o Supremo Tribunal Federal no sistema político brasileiro.

Longe de ser apenas um tribunal que julga casos concretos, o STF tornou-se, principalmente após a Constituição de 1988, uma espécie de “poder moderador” de fato – ainda que não de direito – no sistema político brasileiro. É ele quem dá a palavra final sobre temas que vão desde a prisão em segunda instância, da descriminalização das drogas à constitucionalidade de políticas econômicas.

Imagine o STF como um “sistema imunológico jurídico” do país. Assim como o sistema imunológico humano, que pode reagir de maneiras muito diferentes dependendo de sua programação celular, o STF responde aos estímulos políticos, sociais e jurídicos conforme a “programação” ideológica e jurídica de seus ministros. Uma corte com perfil mais progressista tende a ser mais “receptiva” a demandas por direitos de minorias e interpretações constitucionais expansivas. Uma corte mais conservadora tende a ser mais “receptiva” a argumentos de segurança pública e interpretações mais literais da Constituição.

A pesquisa realizada pelo pesquisador Shandor Torok, da Universidade Federal de Minas Gerais, citada pelo Estadão em novembro de 2024, demonstrou empiricamente o que muitos já intuíam: as decisões dos ministros do STF são significativamente influenciadas por suas orientações ideológicas. Após analisar 1.500 processos julgados pelo plenário do STF entre 2010 e 2018 em que houve divergências, o estudo identificou padrões claros de posicionamento alinhados à orientação ideológica dos magistrados.

Isso não significa que ministros sejam “políticos de toga”, mas reconhece o óbvio: que mesmo juristas brilhantes são seres humanos, com visões de mundo que inevitavelmente influenciam suas interpretações constitucionais. Como qualquer análise de texto complexo – e a Constituição certamente é um – há múltiplas leituras possíveis dentro do espectro da razoabilidade jurídica.

A MATEMÁTICA DAS TOGAS

Compreendido o papel crucial do STF, vejamos os números concretos do que está em jogo nas próximas eleições:

Atualmente, a composição do STF por presidente que indicou é a seguinte:

  • Lula: 4 ministros (36,4%)
  • Dilma Rousseff: 3 ministros (27,3%)
  • Jair Bolsonaro: 2 ministros (18,2%)
  • Michel Temer: 1 ministro (9,1%)
  • Fernando Henrique Cardoso: 1 ministro (9,1%)

Considerando a idade de aposentadoria compulsória de 75 anos, entre 2027 e 2034 – período que abrangeria potencialmente dois mandatos de um presidente eleito em 2026 – teremos as seguintes aposentadorias:

Isso significa que um presidente eleito em 2026 poderia indicar dois ministros em seu primeiro mandato, e se reeleito, mais três ministros no segundo mandato – totalizando cinco ministros, ou seja, 45% da composição da Corte.

É como se um maestro pudesse substituir quase metade dos integrantes de uma orquestra sinfônica. Mesmo que a partitura (a Constituição) permaneça a mesma, a interpretação e a execução serão inevitavelmente diferentes. Algumas partes podem ser enfatizadas, outras tocadas com mais suavidade, mudando fundamentalmente a experiência do ouvinte.

Vale ressaltar que esses cinco ministros permaneceriam na Corte muito além de 2034. Os indicados mais jovens poderiam ficar até por volta de 2050, influenciando a jurisprudência brasileira por mais de duas décadas.

O QUE ESTÁ VERDADEIRAMENTE EM JOGO

Para compreender concretamente o impacto dessas potenciais mudanças, basta olhar para algumas decisões recentes e divididas do STF.

Em março de 2025, por exemplo, o STF mudou sua posição e ampliou novamente o alcance do foro privilegiado por 7 votos a 4. A nova decisão estabeleceu que autoridades mantêm a prerrogativa mesmo após deixarem os cargos, revertendo parcialmente uma decisão anterior de 2018 que havia restringido esse privilégio. Decisões como essa, tomadas por margens estreitas, mostram como a composição do tribunal pode alterar substancialmente interpretações constitucionais.

Outras decisões sensíveis que foram tomadas por margens apertadas nos últimos anos incluem temas como a constitucionalidade de políticas de cotas raciais, a possibilidade de prisão em segunda instância, a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal, e a extensão da liberdade religiosa frente a outros direitos.

O próximo presidente, dependendo de sua orientação política, poderá influenciar profundamente como o STF decide sobre temas polarizadores como:

  • Limites da liberdade de expressão vs. combate à desinformação
  • Direito à privacidade vs. necessidades de investigação criminal
  • Direitos das minorias vs. valores tradicionais
  • Intervenção estatal na economia vs. livre mercado
  • Centralização de poder na União vs. autonomia dos estados

Para a direita brasileira, a vitória em 2026 representaria não apenas a chance de implementar políticas econômicas e sociais alinhadas à sua visão de mundo pelos próximos quatro ou oito anos, mas também de influenciar o entendimento constitucional do país por décadas.

ALÉM DO HORIZONTE ELEITORAL

Diante dessa realidade, a estratégia da direita para 2026 precisa ir muito além da simples disputa eleitoral. Não basta somente vencer, é preciso sair com a vitória e vencer com uma visão clara do que se busca para o Judiciário brasileiro.

Tarcísio de Freitas tem demonstrado entender essa dimensão ao declarar repetidas vezes que “o Brasil precisa de um Judiciário que interprete a Constituição, não que a reescreva”. Essa posição, compartilhada por muitos juristas conservadores, defende uma visão mais restritiva do papel do STF, mais próxima do textualismo que predomina entre conservadores americanos.

Por outro lado, há quem defenda que a própria estrutura do STF precisa ser repensada. Diversas Propostas de Emenda à Constituição tramitam no Congresso sugerindo mandatos fixos para ministros do STF, em vez da atual regra de aposentadoria aos 75 anos. Uma dessas propostas prevê mandatos de 8 anos, não renováveis, o que tornaria a Corte mais responsiva às mudanças na sociedade e diminuiria o impacto político de cada indicação individual.

Críticos dessa proposta, contudo, argumentam que mandatos mais curtos poderiam politizar ainda mais o tribunal, tornando os ministros mais suscetíveis a pressões externas por estarem de olho em suas carreiras pós-STF. Além disso, mandatos mais curtos poderiam prejudicar a estabilidade da jurisprudência, um valor importante para a segurança jurídica.

Independentemente da solução institucional adotada no longo prazo, o fato é que, para a próxima década, as regras do jogo já estão estabelecidas. E essas regras fazem de 2026 um ponto de inflexão para o futuro jurídico do país.

PARA ALÉM DE 2026

Para a direita brasileira, vencer em 2026 não significa apenas implementar uma agenda econômica liberal ou políticas de segurança pública mais rígidas durante o mandato presidencial. Significa a oportunidade de moldar a interpretação constitucional brasileira possivelmente até 2050, através de indicações ao Supremo Tribunal Federal.

É como plantar uma árvore cujos frutos serão colhidos não apenas pelo jardineiro, mas por seus filhos e netos. A sombra dessa árvore, ou a ausência dela, afetará gerações de brasileiros ainda nem nascidos.

Por isso, mais importante que debater nomes de potenciais candidatos, é fundamental que a direita brasileira discuta profundamente qual visão de Constituição e de papel do Judiciário deseja para o país.

As perguntas não são apenas “quem pode vencer?” ou “como vencer?”, mas “o que fazer com a vitória?” e “que legado deixar para as próximas décadas?”

A resposta a essas perguntas definirá não apenas o futuro eleitoral da direita brasileira, mas o próprio equilíbrio institucional do país pelas próximas décadas.

Contribuidor

Escrito por Anderson Nunes

Especialista em análise política. Há mais de 7 anos operando no mercado financeiro, com formação em engenharia e em gestão pública. Investidor com grande experiência em opções e conhecedor do cenário político brasileiro e sua influência sobre o mercado financeiro. Comando diariamente o programa Canal Auxiliando no YouTube passando um overview do mercado, traduzindo as complexidades das informações de Brasília em análises precisas e diretas, que podem ser utilizadas nas decisões de investimentos

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