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Pensar em Apostas

Este texto é uma continuação direta da reflexão iniciada a partir de O Melhor Perdedor Vence. Se ali o ponto central era aprender a conviver com a perda, o passo seguinte é inevitável: entender como tomar decisões melhores em ambientes de incerteza e, sobretudo, quando parar.

É exatamente nesse ponto que os livros Thinking in Bets(Pensar em Apostas) e Quit(Desistir), de Annie Duke, se conectam de forma quase natural. Ambos partem do mesmo princípio que rege o mercado financeiro: decisões não são certas ou erradas. São apostas feitas sob incerteza, com informações incompletas e resultados assimétricos.

Enquanto Thinking in Bets ensina a avaliar decisões pela qualidade do processo, e não pelo resultado imediato, Quit avança um passo além ao questionar um dos maiores tabus comportamentais do mercado: a dificuldade de desistir. Juntos, os dois livros formam uma base complementar. Um ensina como pensar em probabilidades. O outro ensina quando encerrar uma aposta cuja probabilidade deixou de ser favorável.

A tese central que conecta essas duas obras é desconfortável para a maioria das pessoas. A maior parte das decisões ruins não nasce de falta de inteligência ou técnica, mas de apego ao resultado. O ser humano é condicionado a julgar decisões pelo que aconteceu depois, não pela qualidade da leitura no momento em que a decisão foi tomada.

Annie Duke constrói sua visão a partir do pôquer profissional, um ambiente onde decisões corretas podem gerar perdas e decisões erradas podem gerar ganhos. Esse ponto confunde quase todo mundo no mercado financeiro. Um trade pode dar lucro e ainda assim ter sido mal executado. Outro pode gerar prejuízo e ter sido absolutamente correto.

Quando o trader passa a medir sua competência apenas pelo PL imediato, ele reforça comportamentos ruins e enfraquece os bons. Com o tempo, o processo se deteriora sem que isso fique evidente. O mercado até pode recompensar o erro no curto prazo, mas cobra a conta no longo.

Outro ponto central de Thinking in Bets é a separação entre ego e decisão. Pessoas que precisam estar certas deixam de aprender. No mercado, estar errado não é exceção, é regra estatística. Quem não aceita isso passa a distorcer análises, buscar apenas confirmações e ignorar informações contrárias. A leitura deixa de ser probabilística e passa a ser defensiva.

Já em Quit, Annie Duke ataca um dogma ainda mais profundo: a ideia de que desistir é fracasso. Desde cedo somos ensinados a acreditar que persistir sempre é virtude e que abandonar um plano é sinal de fraqueza. No mercado, essa crença custa caro.

A incapacidade de desistir aparece de várias formas. Manter uma posição porque “já caiu demais”. Segurar uma tese que perdeu fundamento porque “uma hora volta”. Continuar operando um método que não funciona mais porque houve investimento emocional, tempo ou dinheiro. Isso não é convicção. É apego.

Bons decisores não persistem cegamente. Eles reavaliam constantemente se a aposta ainda faz sentido. Persistir só é racional quando a relação risco-retorno continua favorável. Caso contrário, sair cedo não é desistência. É eficiência.

No trading e nos investimentos, isso se traduz em uma habilidade rara: encerrar ciclos. Fechar operações, abandonar teses, mudar estratégias e reduzir exposição quando o contexto muda. Quem não sabe desistir transforma decisões temporárias em prisões emocionais.

O elo entre os dois livros é claro. Pensar em apostas ensina a conviver com a incerteza. Saber desistir ensina a realocar capital quando a probabilidade deixa de estar a seu favor. Juntos, eles formam uma base sólida para quem entende que sobreviver no mercado é mais importante do que estar certo.

No fim, Annie Duke não ensina como ganhar mais trades. Ela ensina como tomar decisões melhores ao longo do tempo. E, no mercado, decisões melhores repetidas são o único caminho consistente para resultados sustentáveis.

Cinco insights centrais dos livros

O primeiro insight é que toda decisão é probabilística. Não existe certeza no mercado, apenas apostas melhores ou piores dadas as informações disponíveis. Avaliar decisões pelo resultado imediato distorce o aprendizado.

O segundo insight é que lucro não valida decisão. Ganhar dinheiro não significa que o processo foi correto. O mercado recompensa o acaso no curto prazo e pune o erro apenas no longo.

O terceiro insight é que estar errado não é falha moral. O erro faz parte do jogo. O problema não é errar, é não atualizar a leitura quando novas informações surgem.

O quarto insight é que desistir pode ser uma habilidade estratégica. Sair de uma tese, posição ou estratégia quando a probabilidade muda preserva capital e clareza mental. Persistir sem edge é o verdadeiro erro.

O quinto insight é que boas decisões exigem desapego do ego. Quem precisa estar certo perde a capacidade de pensar em probabilidades. No mercado, sobreviver exige humildade estatística.

No mercado, não vence quem insiste mais. Vence quem decide melhor, aceita a incerteza e sabe sair quando a aposta deixa de fazer sentido.

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Quero muito ler a visão de vocês nos comentários.

*Vocês gostariam de uma live de livros na Investfy?

João Ascoli

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Escrito por João Ascoli

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